Safra
recorde de grãos e financiamento
facilitado para algumas regiões
fazem da aviação agrícola
um dos setores que mais crescem no país
- por Elenildes Dantas (Aero Magazine)
A Safra de 2002 foi considerada ótima
para a aviação agrícola
brasileira, atividade que pulverizou
15 milhões de hectares graças
ao crescimento da produtividade da agricultura
no país, principalmente aquela
parcela cuja produção
é voltada para o mercado internacional,
como é o caso da soja. Em 2004,
o setor agrícola espera ter um
desempenho semelhante ou até
melhor. Assim como a produtividade no
campo, a venda de aeronaves agrícolas
também cresceu. A Indústria
Aeronáutica Neiva, fabricante
do modelo nacional Ipanema, vendeu 56
aviões em 2003, o dobro do que
estava previsto. É a maior vendagem
desde 1977. O grande responsável
por essa explosão é o
financiamento. Isso porque a região
Centro-Oeste do país, onde a
agricultura mais cresce, possui uma
linha de crédito especial para
compra de aeronaves. Do total de aviões
vendidos pela Neiva, 80% foi para o
Mato Grosso através da linha
de crédito FCO (Fundo Constitucional
de Financiamento do Centro-Oeste) que
oferece pagamento em dez anos, carência
de 12 a 36 meses e taxa de juro de 10,75%
ao ano. Outras regiões, como
Norte e Nordeste, também possuem
essa linha de crédito, o FNO
e o FNE, respectivamente.
Em outras regiões do país
existe o Finame Agrícola, para
o produtor rural ou cooperativas, e
o Finame Especial, para pessoa física
ou jurídica. Em ambos os casos,
as taxas de juros são maiores
do que as aplicadas pelos Fundos Constitucionais.
"Nossa luta é para estender
esse tipo de financiamento para todo
o país, tanto para pessoa física
como jurídica", defende
Carlos Heitor Belleza, presidente do
Sindag (Sindicato Nacional das Empresas
de Aviação Agrícola).
Aeronaves estrangeiras só podem
ser financiadas pela própria
fábrica ou pelo EXIM-Bank norte-americano.
Nos últimos três anos a
frota de aeronaves agrícolas
tem crescido de 8% a 12% ao ano, número
expressivo para a aviação
civil brasileira. Segundo o Sindag,
todos os anos a aviação
agrícola cobre uma área
de sete a oito milhões de hectares
cultivados. "Ainda é muito
pouco se comparado aos 45 milhões
de hectares cultivados no Brasil, o
que prova que a atividade precisa ser
melhor explorada", avalia Belleza.
O Rio Grande do Sul é o estado
com o maior número de empresas
aeroagrícolas. Abriga 74 das
250 registradas no DAC (Departamento
de Aviação Civil). Mas
o Mato Grosso, é o estado com
a maior frota estimada em mais de mil
aviões. A região Centro-Oeste
é a que mais cresce, tanto em
produtividade agrícola como no
uso de aeronaves. As duas culturas principais
são a soja e o algodão.
O pico da aplicação aeroagrícola
é de dezembro a fevereiro mas
o no Centro-Oeste culturas como o algodão
vão até junho. Assim,
os pilotos da região Sul, após
a aplicação no arroz,
sobem em revoada para pulverizar algodão.
É a famosa migração
do Sul para o Norte e Centro-Oeste.
Outro fator interessante é a
crescente transferência de pilotos
da aviação regular para
a agrícola. "O campo é
um mercado promissor e está virando
uma alternativa de trabalho para pilotos
de outras áreas", informa
Cláudio Patta, diretor do Denag
(Departamento de Aviação
Agrícola) do Sindicato Nacional
de Aeronautas. Segundo Patta, a luta
do sindicato para a regularização
da profissão do aviador agrícola
tem dado frutos, e hoje 50% dos pilotos
agrícolas no Brasil possuem carteira
assinada. Os novos pilotos estão
ingressando nas empresas de forma regular.
Na última Convenção
de Trabalho, a categoria conseguiu um
aumento do piso salarial de 24%, além
de 30% do adicional de perigo e 15,5%
de participação nos lucros.
De acordo com o Sindag, cada empresa
sindicalizada possui um funcionário
credenciado em segurança de vôo.
Os operadores, porém, reclamam
da rigidez da legislação
brasileira e dizem que ela é
praticamente uma cópia das regras
aplicadas nos Estados Unidos. "Exigimos
uma maior flexibilização
das normas para operar com segurança,
respeitando os acordos internacionais,
mas dentro da realidade brasileira.
Não temos recursos humanos, materiais
ou financeiros para suportar leis tão
rígidas", protesta Carlos
Belleza, do Sindag. O tão anunciado
motor à álcool também
é fonte de especulações.
Para alguns será a salvação
da aviação agrícola;
outros vêem a novidade com certo
ceticismo.
O grande trunfo do motor à álcool
é reduzir significativamente
o custo operacional ao utilizar um combustível
muito mais barato que a gasolina de
aviação. Muitos pilotos
apostam na eficácia desse motor
mas temem que após a sua certificação
seja criado um álcool especial
para a aviação com o preço
semelhante ao da avgas. Também
consideram o preço da conversão
(US$ 20.000,00) muito elevado. Mesmo
assim, 80% dos EMB 202 Ipanema vendidos
pela Neiva para serem entregues até
dezembro têm a opção
de conversão para álcool.
A homologação do motor
à álcool está prevista
para dezembro deste ano, mas estima-se
que de 30% a 35% dos aviões agrícolas
voaram com álcool na safra passada,
inclusive com alguns acidentes confirmados.
"Havia pilotos voando sem nenhuma
regulamentação, por isso
apressamos o processo de certificação
do motor a álcool", revela
o coronel-aviador Ajax Augusto Mendes
Corrêa, responsável pela
aviação agrícola
no DAC. Tanto o projeto da Neiva como
o da Aeroálcool (para o modelo
Piper Pawnee) pretendem homologar um
motor que use o álcool hidratado,
o mesmo utilizado pelo automóvel.
A grande questão é garantir
a qualidade do produto.
Uma saída seria comprar direto
das usinas que podem oferecer uma boa
negociação baseada na
sua grande produção. A
usina pode garantir a qualidade do álcool
mas o motor deverá ser certificado
com capacidade para suportar o álcool
de qualquer posto do Brasil. Outra questão
é a garantia de que os usineiros
produzirão combustível
suficiente para atender a demanda. "Talvez
seja necessário haver um órgão
regulador par evitar que amanhã,
se o preço do açúcar
subir, o usineiro deixe de produzir
o álcool para produzir açúcar",
defende o coronel Ajax. A idéia
é certificar o motor primeiro
para a aviação agrícola
e, em seguida, para todos os modelos
a pistão, visando baratear o
custo do vôo de instrução.
Segundo dados do DAC, o Brasil produz
13 bilhões de litros de álcool
e tem capacidade para produzir 16 bilhões,
o que corresponderia a uma economia
de 74 milhões de barris de petróleo.
A reativação da Fazenda
Ipanema gerou grande expectativa no
setor, mas ainda não tem prazo
para acontecer. Localizada na região
de Sorocaba, interior de São
Paulo, a Fazenda Ipanema já foi
referência de qualidade na formação
de pilotos agrícolas. Há
mais de dois anos, o DAC firmou um acordo
de cooperação com o Ministério
da Agricultura para reativar os cursos
de formação de pilotos
agrícolas, especialmente um curso
de padronização de instrutores,
além da criação
do curso de piloto-bombeiro. Quatro
aviões foram recuperados, dois
EMB 210A Ipanema e dois Piper PA-18,
mas falta completar a infra-estrutura
da escola, equipar os alojamentos dos
alunos, instalar uma bomba de combustível
e recuperar a estrada de acesso ao local,
tarefas cuja responsabilidade é
do Ministério da Agricultura
e que ainda não foram cumpridas.
Existem mais de 300 alunos inscritos
para os futuros cursos. Este mês,
representantes do DAC e do Ministério
da Agricultura se reunirão para
definir novos prazos.
A princípio, seriam reativados
os cursos de pilotos e instrutores,
e depois o curso de piloto-bombeiro,
que exige a compra de aeronaves para
combate a incêndio. O projeto
do avião-bombeiro envolve o Ministério
do Meio Ambiente e o Ibama (Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente). O DAC
já fez um levantamento do modelo
mais adequado ao combate a incêndios
no Brasil com menor custo operacional.
A idéia é utilizar aviões
agrícolas de grande porte, abrindo
um novo campo de trabalho das aeronaves
que ficam ociosas na entressafra - que
coincide com o período de estiagem
e de maior ocorrência de incêndios.
De olho nessa fatia do mercado brasileiro,
o avião polonês Dromader
M18-B finalmente parece ter encontrado
seu espaço. Existem apenas dez
unidades das versões antigas
de Dromader voando em lavouras brasileiras.
Em junho deste ano, porém, a
Condor Aircraft Aeroagrícola
firmou parceria com a PZL, fabricante
do Dromader, e já vendeu 12 unidades
do avião. Seis devem ser entregues
até o fim de novembro e o resto
entre março e abril de 2004.
"Onze das doze aeronaves vendidas
possuem o equipamento de combate a incêndio",
confirma Marcelo Simoni, diretor da
Condor Aircraft. Ele reconhece que uma
das grandes dificuldades para o operador
brasileiro do Dromader era a reposição
de peças. Para resolver esse
problema a Condor utilizará o
sistema On-Site, no qual a peça
é encomendada pela internet e
entregue em até 24 horas, em
qualquer região do país.
A Condor também está
homologando seis oficinas distribuídas
pelo Brasil para realizar a manutenção
das aeronaves sem perder a garantia
da fábrica. Como parte desse
processo, a fábrica PZL enviará
uma equipe formada por dois mecânicos
e um piloto de testes que ficará
no Brasil durante toda a safra treinando
todos os que estiverem envolvidos na
operação do Dromader,
de pilotos á equipe de solo.
Por fim, a tecnologia do pulverizador
eletrostático ainda não
vingou. Desenvolvida nos Estados Unidos
o sistema consiste no carregamento de
partículas pulverizadas com eletricidade
positiva e negativa, fazendo com que
elas sejam literalmente atraídas
pelas plantas, cuja carga elétrica
é neutra. Esta atração
resolve praticamente todos os problemas
da aplicação aérea
pois além de os produtos aplicados
atingirem seu alvo com precisão
espalham-se homogeneamente dada a repelência
natural entre as gotículas eletricamente
carregadas.
Em mais de dois anos, foram vendidos
apenas dois aparelhos no Brasil. O principal
empecilho é o preço, de
US$35.000,00, investimento considerado
alto demais pela maioria dos produtores.
Para reverter a situação,
a Neiva negocia com o fabricante a possibilidade
de nacionalizar algumas partes do aparelho
e, assim, baratear o custo.